Como começa uma cervejaria cigana (parte 2): enfrentando a pandemia

Acompanhamos mais uma etapa da nova cervejaria cigana Ballena Brewery e como fizeram para navegar pelos obstáculos do mercado nos últimos meses

Quer ler a parte 1 da jornada da Ballena Brewery? Então clique aqui.

Cervejarias ciganas que se iniciam no mercado na maioria das vezes possuem estruturas bastante enxutas em diversos aspectos como equipe, finanças, portfólio, marketing e vendas, o que torna seu começo sempre desafiante no sentido de crescer volume de vendas junto a consumidores.

No começo do ano mostramos o início da jornada da cervejaria cigana catarinense Ballena Brewery de Florianópolis (SC), formada pelas sócias Juliana Santana e Mariana Correia. Agora retornamos para saber como enfrentaram os meses da pandemia que mudaram profundamente o mercado de cerveja e logicamente, impactou os planos do negócio em 2020.

De fato, a Ballena teve poucas oportunidades de venda antes do início da quarentena, então é possível dizer que seu modelo comercial já se iniciou tendo de se adaptar para que as vendas pudessem ocorrer e isso significou uma partida para o mercado online através de delivery, algo que não havia sido pensado no projeto da cervejaria.

“Tivemos que mudar nossa estratégia toda para nos adaptarmos, a quarentena começou e não tínhamos onde colocar nossos barris para vendas. Então começamos a focar em garrafas e em vendas no delivery, tudo online” comentou Juliana sobre a necessidade de mudanças nos planos com o início da quarentena.


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Marketing será ainda mais fundamental para o mercado de cerveja com o covid-19


A mudança da Ballena mostra bem os impactos que a covid-19 promoveu no mercado de cerveja, provocando um maior foco em embalagens menores como garrafas e latas e a ascensão das vendas online de cervejarias pequenas, algo que atualmente se tornou comum mas que há 8 meses atrás era quase que inexistente na realidade de pequenas cervejarias.

Se tratando especificamente de cervejarias ciganas novas o impacto da pandemia sobre os canais de distribuição foi ainda mais pronunciado, pois elas dependiam quase que exclusivamente de eventos e bares especializados para realizar vendas, opções que repentinamente saíram do ar provocando uma corrida para chegar ao público muitas vezes por vendas diretas online, que foi a solução buscada pela Ballena

Buscar vendas diretas online trazem o desafio da logística de distribuição

Vender diretamente para o público através da internet traz um novo obstáculo também anteriormente incomum para pequenas cervejarias artesanais, o de fazer o produto chegar até o consumidor. A Ballena, que aumentou seu portfólio para 3 cervejas, tentou racionalizar este trabalho para buscar eficiência.

“Estipulamos rotas semanais por Florianópolis e grande Florianópolis, e nos dividimos pra fazer essas entregas. A principio seguimos a rota, divulgamos no Instagram, e nunca tivemos maiores problemas, mas claro que conversamos com o cliente para oferecer opções e tentar ser flexíveis” comentou Juliana.

Flexibilidade é uma palavra chave para cervejarias ciganas iniciantes. Basta ler o início da jornada da Ballena publicada na Catalisi e perceber o contraste das perspectivas comerciais da cervejaria, onde as vendas eram pensadas no sentido de buscar oportunidades com o turismo e eventos, oportunidades que desapareceram nos últimos meses.

Vender online não é só oferecer preço e entrega

Vender por meios digitais vai muito além apenas de expor preços nas mídias sociais e comunicar os locais de entrega, a cerveja artesanal tem muito de seu valor relativo a engajar o público com sua marca e produto de uma forma interessante, um dos pontos que também recebeu investimento da cervejaria.

“Nossa ideia era espalhar a marca, já que não estaríamos nos bares pra isso, então precisava ser digitalmente, então começamos com sorteios e logo depois um projeto de sustentabilidade onde reciclávamos os papéis que faziam os cartões que vão junto a entrega para o público. Começamos também a trabalhar com vídeos, pra botar mais a cara no negocio, literalmente e vimos como as pessoas se identificaram com isso” explicou Jualiana sobre o marketing digital desenvolvido nos últimos meses para a Ballena.

Além disso a Ballena buscou amplificar sua possibilidade de chegar até o conhecimento de outros consumidores fazendo parcerias com outros pequenos negócios.

“Fizemos algumas parcerias com outros pequenos negócios também de vários segmentos doces, frutos do mar, sabonetes. Então um ajuda o outro na divulgação, nos nossos perfis pessoais também temos disseminado mais a cervejaria. Percebemos que o conjunto de todas essas pequenas coisas, fazem toda a diferença pros resultados que estamos conseguindo” avaliou Juliana.

É muito interessante perceber como a busca por autenticidade explorando de forma criativa mídias digitais e por conexões com pequenos produtores fizeram parte da rotina da Ballena Brewery nos últimos meses, pois de fato estas seriam as duas melhores recomendações para um cervejaria cigana em início de estrada enfrentando os obstáculos que apareceram nos últimos tempos.

O mercado de cervejas artesanais continua, dentro de sua diversidade de modelos de negócio, mostrando um grande nível de resistência a dificuldades encontradas. Parte disso está ligado a paixão pela bebida, mas também cada vez mais imbuído de conhecimento sobre os caminhos e oportunidades que surgem dentro das limitações atuais. A capacidade para se adaptar a mudanças cada vez mais dinâmicas parecem ser um requisito para o futuro próximo dessas pequenas cervejarias.

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Sobre o autor

Felipe Freitas é analista do mercado de cerveja, engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ. Fundador e editor do portal Catalisi.