Crise do Metanol: 28% das bebidas destiladas no Brasil são falsas e ameaçam a indústria

Setor de destilados enfrenta crise com o mercado consumidor e risco de retração de vendas diante do avanço do mercado ilegal

A crise envolvendo a presença de metanol em bebidas destiladas falsificadas no Brasil trouxe à tona um problema estrutural que ameaça não apenas a saúde pública, mas também a sustentabilidade do setor formal de bebidas alcoólicas. Estudo da Euromonitor revelou que 1,4 em cada cinco bebidas destiladas comercializadas no país é falsa, confirmando a dimensão de um mercado ilegal que movimenta bilhões de reais à margem da lei.

Além do impacto sanitário, a situação coloca em xeque a confiança do consumidor em marcas legítimas. Entidades do setor, como a Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD), vêm reforçando que a crise pode comprometer o desempenho de todo o segmento, do produtor ao bar e restaurante, caso medidas de fiscalização mais rigorosas não sejam adotadas rapidamente.

A gravidade da crise e a resposta do setor

A adulteração com metanol tem causado mortes e intoxicações em diferentes estados do país, com grande concentração em São Paulo, aumentando a atenção das autoridades e da imprensa para a questão que está sob investigação das autoridades policiais.

A ABBD tem buscado separar a atuação criminosa do mercado ilegal do setor produtivo formal, que opera sob rígidas normas sanitárias e tributárias. Em comunicado, a associação destacou que o crescimento da falsificação no Brasil deixou de se concentrar em bebidas contrabandeadas para avançar sobre produtos adulterados internamente, dificultando ainda mais a fiscalização.


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Risco de perda de credibilidade das marcas legítimas

Segundo a ABBD, o maior risco agora é que o medo gerado pelos casos de intoxicação afete também a percepção de segurança das marcas que atuam legalmente. O efeito reputacional pode reduzir a disposição do consumidor em consumir destilados, mesmo de fabricantes conhecidos, trazendo consequências para todo o mercado formal.

Potencial retração de vendas em toda a cadeia

Uma queda no consumo impactaria não apenas as grandes marcas de destilados, mas também bares, restaurantes e distribuidores que dependem das vendas de bebidas alcoólicas. Em alguns casos, estabelecimentos já vêm suspendendo temporariamente a comercialização de destilados como medida preventiva.

A insegurança pode gerar perdas econômicas relevantes em toda a cadeia, reduzindo margens e inibindo investimentos.

O avanço do mercado ilegal de bebidas destiladas

De acordo com o estudo da Euromonitor a pedido da ABBD, cerca de 28% do mercado de destilados no Brasil já é dominado por produtos ilegais. O segmento ilegal tem migrado de práticas de contrabando e descaminho de bebidas importadas para falsificações internas em território nacional, mais baratas e de difícil rastreamento. Esse movimento amplia o desafio das autoridades e coloca pressão adicional sobre o setor formal.

Os dois principais métodos de falsificação, comumente encontrados no mercado, são o “refil” de garrafas de marcas reconhecidas utilizando produtos de baixo custo ou a falsificação a partir do uso de álcool impróprio para consumo humano., colocando em risco a saúde dos consumidores.

Publicação da BBC Brasil mostra como existe um vasto mercado online de fornecimento em escala de rótulos, garrafas de diferentes marcas e até mesmo selo da Receita Federal que suprem esse mercado ilegal.

A discrepância de preços é o principal atrativo.: durante o estudo identificou-se que produtos falsificados são, em média, 35% mais baratos, e em marketplaces online, a diferença do whisky falsificado para o original chega a até 48%. 

A importância da fiscalização e do papel das entidades setoriais

A ABBD, em parceria com a Abrasel e a Abrabe, tem realizado treinamentos para bares e restaurantes sobre como identificar falsificações, ao mesmo tempo em que defende medidas mais rígidas de fiscalização e punição mais severa para adulteradores.

A associação ressalta que apenas com o fortalecimento das entidades regulatórias e o combate efetivo ao mercado ilegal será possível proteger o consumidor e garantir o bom funcionamento de um setor que cumpre a lei.

Impactos potenciais para outras categorias de bebidas alcoólicas

O temor gerado pela crise do metanol pode transbordar para outros segmentos, como o de cervejas e vinhos. O risco de contaminação da confiança do consumidor em toda a categoria de bebidas alcoólicas é real, e poderia restringir o consumo de forma generalizada, prejudicando até marcas consolidadas e categorias que não são diretamente afetadas pela adulteração com metanol.

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Sobre o autor

Felipe Freitas é analista do mercado de cerveja, engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ. Fundador e editor do portal Catalisi.