Na terra da Oktoberfest o mercado de cerveja passa por profundas mudanças

Na Alemanha a queda de consumo, guerra de preços e ascensão de microcervejarias têm estabelecidos profundas alterações na dinâmica do mercado de cerveja nacional

Sob um ponto de vista geral e popular a Alemanha é enxergada como a terra da cerveja, em especial pela história da Oktoberfest, uma festa tradicional que ocorre no final de setembro em Munique, no sul do país anualmente.

As cervejarias tradicionais alemãs têm origem secular e estão entre as empresas mais antigas do mundo. Elas apresentam, de acordo com cada região, uma relação identitária muito forte com a cultura de cada local da Alemanha.

Apesar de nacionalmente o país apresentar uma grande variedade de estilos de cerveja o mercado alemão é extremamente regionalizado, com poucos players de abrangência nacional. Sendo que localmente nos pontos tradicionais não há a variedade de dezenas de torneiras, comuns atualmente em pontos de cervejas artesanais pelo mundo, por outro lado há uma grande valorização de estilos que pertencem a uma determinada região.

Com um consumo per capita entre os mais altos do mundo, o mercado de cerveja alemão, sob um ponto de vista analítico, têm apresentado uma progressiva alteração na sua dinâmica de consumo e também nas características da oferta da bebida nos últimos 30 anos, com queda de preços e o aparecimento recente de microcervejarias.

A queda no consumo de cerveja na Alemanha

Desde os anos 1970 a Alemanha vem apresentando um declínio gradual e consistente no volume de consumo de cerveja no país. Essa tendência só foi alterada pontualmente quando a Alemanha sediou a Copa do Mundo, ou quando a mesma foi campeã dela.

Essa tendência é associada em grande parte a uma maior consciência de hábitos de vida saudável que vêm tomando grande proporção, principalmente nos países desenvolvidos. Conforme uma determinada pessoa envelhece ela tende a beber menos e as gerações que seguem têm consumido menos cerveja que suas antecedentes.

Apesar deste movimento, pode-se dizer que o consumo de cerveja na Alemanha passou de muito alto para apenas alto, estando entre os maiores do mundo (atrás apenas de tchecos e austríacos). O consumo médio per capita que era de 151 litros por pessoa em 1976 em 2018 atingiu 93 litros por pessoa. No Brasil este valor é de 60,7 litros., para efeitos de comparação.

A guerra de preços é uma das estratégias para o menor volume de consumo

Esse fenômeno têm levado a dois movimentos de mercado. O primeiro é uma guerra de preços das grandes cervejarias na luta para tentar competir com aproveitamento máximo de suas escalas. O outro é a ascensão das cervejas sem álcool que com a mudança de mentalidade do público têm formado um novo nicho de crescimento de 6,5% ao ano.


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As grandes cervejarias alemãs cresceram sua capacidade de produção sempre muito em função de seu mercado interno. Diferente de seus pares europeus, a exportação de cerveja na Alemanha têm um dos menores percentuais relativos a produção nacional no continente.

Logo, as grandes cervejarias vendem cervejas com qualidade tradicional alemã, porém muito baratas no intuito de reduzir ao máximo sua capacidade ociosa.

A ascensão de microcervejarias alemãs

O fenômeno de crescimento de microcervejarias também tem ocorrido na Alemanha. Algo que seria considerado paradoxal uma vez que o consumo da bebida como um todo está caindo no país, mas é um fenômeno ganha paralelos em outros locais do mundo numa dinâmica chamada de premiunização.


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O avanço da cerveja artesanal na Alemanha têm ocorrido de maneira mais vagarosa que em outros países da Europa, devido principalmente a cultura de consumo e qualidade tradicional da cerveja alemã que como mencionado teve seu preço reduzido nas últimas décadas.

Mesmo assim, a busca por variedades e por estilos inspirados principalmente no mercado americano também têm encontrado espaço no mercado alemão, principalmente nos grandes centros urbanos, porém mesmo as pequenas localidades encontram alguns representantes.

Mesmo pequenas cidades alemãs, como a ex-capital alemã Bonn, possuem cervejarias artesanais

Nos últimos 10 anos 206 novas cervejarias entraram em operação na Alemanha de acordo com o portal de estatísticas do governo federal Statistisches Bundesamt. Segundo especialistas essas microcervejarias têm sido menos afetadas pela queda do consumo de cerveja no país, enquanto essa redução está associada em maior parte às cervejarias tradicionais de maior porte.

Na Oktoberfest tradicional de Munique apenas as 6 grandes cervejarias da cidade(Augustiner, Hofbräu, Lowenbräu, Paullaner, Hacker-Pschorr e Spaten) têm permissão de ter tendas no evento.

Apesar do tradicionalismo bávaro, dado as condições e a competitividade do mercado local, seria estranho, porém não inimaginável, que dentro de algumas décadas uma pale ale aparecesse na festa de Munique.

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Sobre o autor

Felipe Freitas é analista do mercado de cerveja, engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ. Fundador e editor do portal Catalisi.