Imagem: Felipe Freitas
A BrewDog, uma das maiores cervejarias artesanais da Europa, enfrenta um momento desafiador em seu posicionamento de mercado.
Em entrevista ao jornal The Telegraph, o presidente da rede de bares Loungers, com 300 unidades por todo o Reino Unido, afirmou que a marca se tornou “irrelevante” para o público britânico, justificando a retirada de suas cervejas das prateleiras de seus estabelecimentos. A declaração simboliza a mudança de percepção sobre a empresa que, por mais de uma década, esteve no centro da revolução craft beer no Reino Unido.
Fundada em 2007 e conhecida por sua agressividade de marketing e crescimento acelerado, a BrewDog já figura entre as maiores cervejarias independentes do continente, com presença em 57 países e produção superior a 100 milhões de litros em 2023.
Entretanto, sinais recentes apontam para retração: muito além da rede Loungers, nos últimos dois anos, quase 2.000 pubs no Reino Unido deixaram de vender seus rótulos — entre eles a emblemática Punk IPA — substituídos por concorrentes como Camden Town e Beavertown.
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De acordo com o CEO da Loungers, a decisão de retirar a BrewDog de suas ofertas não foi apenas uma resposta a números de vendas, mas também ao que ele classificou como um “desgaste natural” da marca junto ao consumidor.
O executivo destacou que a BrewDog deixou de ter o apelo inovador que a diferenciava no mercado e, em vez disso, acabou diluída em meio a um portfólio cada vez mais competitivo de cervejarias independentes e marcas controladas por multinacionais. Para os bares da rede, seguir oferecendo BrewDog já não gerava valor agregado à experiência do cliente.
Outro ponto levantado pelos executivos da Loungers foi o alinhamento estratégico com marcas que demonstram maior engajamento com consumidores locais e maior consistência de posicionamento.
Nesse sentido, rótulos de Camden Town e Beavertown, controlados pelas gigantes AB InBev e Heineken respectivamente, foram apontados como exemplos de cervejarias que conseguem se conectar de forma mais direta com o público jovem, urbano e digitalizado — justamente o perfil predominante nos bares da rede. A retirada da BrewDog, portanto, foi encarada não apenas como um corte operacional, mas como um reposicionamento da Loungers em busca de relevância cultural e comercial no setor de hospitalidade.
Em julho de 2025, a Brewdog anunciou o fechamento de dez bares próprios, incluindo a unidade pioneira de Aberdeen. A decisão ocorreu em meio ao que a direção classificou como um “período extremamente difícil” para a hospitalidade britânica, pressionada por custos crescentes e queda de consumo.
Os números financeiros refletem esse cenário. Depois de registrar um prejuízo de cerca de £59 milhões em 2023, a BrewDog conseguiu recuperar parte da rentabilidade em 2024, quando apurou um EBITDA ajustado de £7,5 milhões.
Alguns números recentes da Brewdog
Pubs que retiraram BrewDog | ~2.000 |
Bares próprios fechados | 10 |
Prejuízo em 2023 | £59 milhões |
Lucro ajustado em 2024 | £7,5 milhões (EBITDA) |
Ainda assim, os desafios permanecem expressivos diante da desaceleração do setor e do enfraquecimento de sua presença nos pubs.
Para reverter a perda de apelo, a BrewDog lançou em 2025 uma reformulação completa de sua identidade visual e de marca, numa tentativa de se afastar de polêmicas anteriores e adotar uma imagem mais corporativa e inclusiva. A mudança coincide com a chegada de um novo comando executivo: James Taylor assumiu o cargo de CEO em março, enquanto Lauren Carrol se tornou COO.
No mercado britânico, o espaço perdido pela BrewDog tem sido rapidamente ocupado por rivais. Marcas como Camden Town, pertencente à AB InBev, e Beavertown, ligada à Heineken, vêm ampliando sua presença em pubs e supermercados, beneficiadas por maior capacidade de distribuição e apoio das controladoras globais.
O risco para a BrewDog não é apenas de retração financeira, mas de perder relevância cultural em um segmento no qual a autenticidade e a conexão com o consumidor são determinantes para a fidelização.
A fala do executivo da Loungers ecoa a preocupação de parte do mercado: a BrewDog, outrora símbolo da rebeldia artesanal, parece atravessar um processo de “normalização” que ameaça seu diferencial competitivo. A aposta agora recai sobre a capacidade do rebranding e da nova gestão em resgatar a relevância da marca junto ao consumidor e em recuperar espaço nos bares britânicos.
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Sobre o autor
Felipe Freitas é analista do mercado de cerveja, engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ. Fundador e editor do portal Catalisi.