Imagem: montagem Catalisi
A Ambev voltou a ocupar a liderança do mercado de cervejas premium no Brasil, retomando um posto que havia perdido há cerca de uma década. No terceiro trimestre de 2025, o portfólio da companhia composto pelas marcas Corona, Stella Artois, Original e Spaten alcançou quase 50% de participação de mercado nesse segmento, superando a Heineken de acordo com a empresa.
O desempenho veio acompanhado de um crescimento de 15% nas vendas de cervejas premium em relação ao ano anterior, consolidando a estratégia da Ambev de reforçar seu portfólio de alto valor e diversificar formatos para diferentes ocasiões de consumo. A virada ocorre em um cenário de retração de volumes totais de cerveja no país, mas com uma clara migração dos consumidores para produtos de maior valor agregado.
Os números do terceiro trimestre de 2025 confirmaram o bom momento da companhia. A Ambev registrou lucro líquido de R$ 4,86 bilhões, um avanço expressivo de 36,4% na comparação anual. A receita líquida atingiu R$ 20,8 bilhões, e o EBITDA ajustado chegou a R$ 7,05 bilhões, praticamente estável, mas com margem ampliada para 33,9%, cerca de dois pontos percentuais acima do ano anterior.
Mesmo com uma queda de volume consolidado de aproximadamente 7,7% no Brasil, a empresa conseguiu melhorar sua rentabilidade, sustentada pelo crescimento de categorias premium e por uma gestão de portfólio mais eficiente. O resultado superou as projeções de analistas e reforçou a percepção de que a Ambev atravessa uma nova fase de expansão de margens e ganhos de eficiência.
Leia mais: 
Brasil irá ampliar vendas de cerveja em 2024 apesar da alta de preços

Ambev investe R$ 150 milhões para ampliar produção de Corona e Spaten
A retomada da liderança no premium é fruto de uma estratégia que combina marketing agressivo, posicionamento de marca e ampliação da oferta de formatos e embalagens. A companhia tem investido em campanhas de grande alcance e patrocínios de alto impacto, reforçando a visibilidade e o valor de seus principais rótulos.
A Spaten, por exemplo, consolidou-se como o rótulo de perfil que combina tradição e força do portfólio, com forte presença em eventos cervejeiros e gastronômicos, mas também em eventos esportivos de luta. A Corona manteve sua narrativa associada ao estilo de vida descontraído e à natureza, ampliando seu alcance entre consumidores mais jovens. Já a Stella Artois segue explorando o território da sofisticação urbana se associando a gastronomia e ao universo do tênis, enquanto a Original atua como ponte entre a tradição brasileira e o consumo premium cotidiano.
Essa variedade de posicionamentos permite à Ambev dialogar com públicos distintos, desde o consumidor aspiracional até o entusiasta mais experiente, mantendo relevância e ampliando o tíquete médio.
Além disso, a empresa diversificou embalagens e tamanhos — de latas menores a garrafas especiais — para adequar-se às condições de preço e às diferentes ocasiões de consumo. A escala de produção e distribuição da Ambev confere à companhia uma vantagem operacional relevante frente aos concorrentes, permitindo ajustes em escala às tendências de mercado.
Enquanto a Ambev avança, a Heineken enfrenta uma fase de desaquecimento em seu desempenho local. O grupo holandês reportou queda de 4,3% nos volumes globais de cerveja e uma redução de 2,2% no segmento premium em seu balanço internacional do terceiro trimestre. No Brasil, a retração foi ainda mais acentuada, com queda de dois dígitos no volume de vendas, segundo o relatório da companhia.
A perda de tração da Heineken ocorre justamente no nicho em que vinha sustentando sua vantagem competitiva nos últimos anos. Marcas como Heineken, Eisenbahn e Baden Baden têm enfrentado maior pressão competitiva, tanto em preço quanto em distribuição, e parte do consumo premium migrou para o portfólio da Ambev.
O cenário inverte uma dinâmica consolidada no mercado: pela primeira vez desde o início da década passada, a Heineken deixa de liderar o segmento que mais cresceu no país e onde concentrou seus principais investimentos de marketing.
O CFO da Ambev, em entrevista para o Bloombeg Linea, classificou a estratégia atual da empresa como um exercício de “ambidestria”, ou seja, a capacidade de crescer em valor sem abrir mão da escala. Isso se traduz em uma gestão de portfólio mais complexa, que combina controle de preços, adaptação de formatos e segmentação de mensagens conforme o público e o canal de venda.
A Ambev também tem explorado novas categorias emergentes, como cervejas de menor teor alcoólico, opções sem álcool e versões de baixa caloria — um conjunto que já representa crescimento de mais de 60% no Brasil dentro da categoria chamada internamente de balanced choices. Essa diversificação reforça a capacidade da companhia de se antecipar às transformações de consumo que estão remodelando o mercado global de bebidas.
Com a liderança reconquistada no segmento premium, a Ambev se reposiciona para uma nova fase de crescimento baseada em valor. A empresa demonstra domínio operacional e de execução em um mercado cada vez mais fragmentado, mas ainda enfrenta desafios macroeconômicos, como renda pressionada e clima desfavorável, que impactam o consumo total de cerveja.
O grande teste será manter a vantagem conquistada. O segmento premium deve continuar sendo o principal campo de disputa no mercado brasileiro, e a resposta da Heineken nas próximas safras mostrará o quão duradoura será essa virada.
Por ora, a Ambev demonstra ter reencontrado o equilíbrio entre volume e rentabilidade — um feito raro em tempos de consumo instável. Sua liderança no premium é mais do que um símbolo de recuperação: é um indicativo de maturidade estratégica e da capacidade de usar a escala a seu favor em um mercado em transformação.
Receba semanalmente o melhor conteúdo sobre o mercado de cerveja
Sobre o autor

Felipe Freitas é analista do mercado de cerveja, engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ. Fundador e editor do portal Catalisi.