Brasil perto do número de 2 mil cervejarias: setor cresce, mas ritmo desacelera

Número de cervejarias segue aumentando no Brasil, mas ritmo de crescimento dessas fábricas no país desacelera

O número de cervejarias no Brasil continua em expansão, ainda que em ritmo mais moderado. Segundo dados publicados recentemente do Anuário da Cerveja 2025, divulgado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), o país alcançou a marca de 1.949 cervejarias registradas em 2024, um crescimento de 5,5% em relação a 2023, quando o total era de 1.847.

Apesar de positivo, o avanço representa uma leve desaceleração em comparação ao crescimento de 6,8% registrado no ano anterior e bem menos que os dois dígitos percentuais de anos anteriores, mostrando que o setor se aproxima de um teto de maturidade como observado em outros mercados análogos pelo mundo.

Duas décadas de expansão e mudança no perfil do mercado

Ao longo dos últimos 20 anos, o número de cervejarias no Brasil passou por uma verdadeira transformação. O país contava com menos de 50 cervejarias em operação no início dos anos 2000. Desde então, um movimento de valorização de produtos artesanais, regionais e com apelo de diferenciação impulsionou a abertura de centenas de microcervejarias.

Esse crescimento acompanha uma tendência global de segmentação do mercado e busca por novas experiências de consumo — ainda que, em volume, a produção dessas marcas continue representando uma fração diminuta do total fabricado no país, dominado por grandes conglomerados como Ambev, Heineken e Petrópolis.


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O crescimento do número de cervejarias revela uma nova dinâmica de mercado, em que pequenos produtores regionais ganham espaço nas prateleiras e nos copos de nichos de consumidores, impulsionando a diversidade de rótulos, estilos e modelos de negócios.

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Ausência de dados sobre fechamentos limita análise mais precisa

Apesar da riqueza de informações sobre aberturas e registros, o Anuário da Cerveja não divulga dados relacionados ao fechamento de cervejarias no país. A ausência desse indicador impede uma análise mais completa sobre os desafios enfrentados pelo setor e sua taxa real de sobrevivência. Iniciativas semelhantes nos Estados Unidos, como as da Brewers Association, publicam regularmente dados de aberturas e encerramentos, o que permite uma leitura mais refinada sobre a maturidade e os gargalos do mercado. A publicação desses dados pelo MAPA seria um avanço importante para compreender com mais precisão o ciclo de vida das cervejarias brasileiras e embasar políticas públicas mais eficazes para o segmento.

Panorama regional: onde estão as cervejarias brasileiras?

A distribuição das cervejarias pelo território nacional segue apresentando forte concentração no Sul e Sudeste do país. São Paulo lidera com 427 cervejarias, seguido de Minas Gerais (221) e Rio Grande do Sul (217). O estado paulista também se destaca pela média de rótulos por estabelecimento, com 30 tipos por cervejaria — bem acima da média nacional de 22,2.

Embora o crescimento absoluto se concentre nas regiões Sudeste e Sul, o Anuário da Cerveja 2025 destaca que os maiores crescimentos percentuais no número de cervejarias ocorreram em estados de menor base instalada. Distrito Federal, Rondônia, Tocantins e Sergipe lideraram em termos proporcionais, revelando uma expansão em regiões historicamente menos desenvolvidas no setor.

Atualmente, 790 municípios brasileiros contam com ao menos uma cervejaria registrada. São Paulo (SP), com 66 cervejarias, Porto Alegre (RS), com 43, e Curitiba (PR), com 29, lideram o ranking nacional em número de estabelecimentos, consolidando-se como polos estratégicos da produção artesanal no país. Em termos proporcionais, o estado com a maior densidade cervejeira é o Rio Grande do Sul, com uma cervejaria para cada 32 mil habitantes.

Entraves e avanços regulatórios para microprodutores

O fortalecimento dessas microcervejarias, no entanto, esbarra em desafios tributários e regulatórios. Questões como bitributação, cobrança de ICMS ST e exigências regulatórias desproporcionais ainda são entraves relevantes para o setor. Neste cenário, a Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva) tem atuado como protagonista em conquistas importantes. Entre os avanços recentes estão:

  • A inclusão de microcervejarias no Simples Nacional;
  • A defesa pela diferenciação de alíquotas de ICMS para pequenos produtores;

Esses esforços têm permitido maior competitividade aos produtores locais e ampliado sua capacidade de permanência no mercado.

Volume de produção cresce de forma moderada, ainda concentrado em grandes grupos

Embora o número de cervejarias siga em expansão, o volume total de produção de cerveja no Brasil permanece altamente concentrado nas grandes indústrias.

A produção nacional registrada em estabelecimentos sob fiscalização federal chegou a 14,3 bilhões de litros em 2024, número que representa uma leve alta em relação aos 14,1 bilhões de 2023. Apesar do crescimento contínuo no número de microcervejarias, essas empresas respondem por menos de 2% do volume total produzido no país, evidenciando um cenário em que a diversidade de rótulos cresce mais rapidamente que a participação efetiva no mercado em litros. A estabilização no consumo per capita e o acirramento da concorrência com bebidas como o vinho, drinks prontos e bebidas não alcoólicas também têm pressionado a performance produtiva do setor como um todo.

Cerveja sem álcool ganha espaço e já representa fatia relevante da produção

Um dos destaques do mercado cervejeiro em 2024 foi o avanço expressivo das cervejas sem álcool, que vêm conquistando cada vez mais espaço tanto nas gôndolas quanto nos tanques de produção.

O segmento atingiu 368,8 milhões de litros produzidos, o que representa 2,57% do volume total de cerveja fabricado no Brasil. Trata-se de um crescimento relevante em relação aos anos anteriores e reflexo direto da mudança de hábitos de consumo, com maior demanda por produtos com menor teor alcoólico ou voltados à moderação.

Esse movimento também acompanha a tendência global de ampliação das categorias “low & no alcohol”, principalmente entre jovens adultos e consumidores preocupados com saúde e bem-estar.

Explosão de rótulos reflete busca por diferenciação

Além da abertura de novas fábricas, o crescimento do setor também pode ser medido pelo aumento no número de produtos registrados: 43.176 tipos de cerveja estavam oficialmente cadastrados em 2024, o maior número já registrado no país. Isso mostra uma dinâmica comercial voltada para a diferenciação de portfólio — uma estratégia adotada principalmente por microcervejarias, que buscam conquistar nichos e manter relevância em mercados locais com edições limitadas, rótulos sazonais e colaborações.

Essa pluralidade de produtos também é impulsionada por eventos, festivais e circuitos especializados, onde a experimentação e inovação de estilos ganham centralidade, como se vê no IPA Day, no Mondial de la Bière ou no Festival Brasileiro da Cerveja.

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Sobre o autor

Felipe Freitas é analista do mercado de cerveja, engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ. Fundador e editor do portal Catalisi.