Cervejarias artesanais sofrem com falta de insumos no Brasil

Mudanças ocorridas no suprimento estão gerando escassez de insumos e pressionam as operações de cervejarias artesanais brasileiras

O redirecionamento para uma maior busca de embalagens combinado com a alta do dólar ao longo do ano estão impondo as cervejarias artesanais no Brasil uma série de desafios adicionais aos que já normalmente acompanham estes negócios.

O maior consumo de cerveja em casa mexeu fortemente com a maneira que as cervejarias tem tentado alcançar os consumidores e isso fortaleceu muito a busca por embalagens pelos produtores de cerveja de todos os níveis de escala.

Este movimento ocorre principalmente devido ao redirecionamento do grande varejo como canal de distribuição de bebidas de maior destaque durante 2020 devido a busca de isolamento social pelos consumidores, somado a ascensão acelerada dos canais de vendas online que também requerem o uso de embalagens para fracionar os volumes de bebidas comercializados.

Com isso, o mercado de cerveja no Brasil está passando por um momento semelhante ao que tem ocorrido nos Estados Unidos e que foi destacado em publicação recente da Catalisi, onde o fornecimento de embalagens ganhou uma demanda muito acima do normal pelos grandes produtores de bebidas o que tem feito com que negócios menores, como cervejarias artesanais, sofram com escassez de insumos pois seu atendimento está num ponto mais baixo da escala de prioridades por ser mais fragmentado e em pequenas quantidades.


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“Nossas vendas nos supermercados cresceram bastante nos últimos meses, mas por outro lado agora temos uma escassez de garrafas de 500 ml nos fornecedores que é o SKU mais usado nos supermercados. Estamos procurando fontes alternativas de garrafas ou trocando por latas por alguns meses, mas mesmo elas estão com risco de sofrer desabastecimento. A parte mais desafiadora aqui é convencer os supermercados a aceitar latas durante um curto período.” comentou Anna Lewis sócia da Wonderland Brewery do Rio de Janeiro.

Já a cervejaria alagoana Hop Bros comentou sobre a dificuldade relacionada não só a obtenção de todos os tipos de embalagem como também o aumento de preços de insumos importados que são fortemente impactados pela cotação do dólar que subiu mais de 39% em 2020.

“Nessa retomada da produção sentimos muitas dificuldades em insumos básicos para exercer nossa atividade, como papel (caixas de papelão), plástico (pet growlers) e garrafas, como as especiais. Além disso os insumos para produção como malte, lúpulo e fermento são todos importados, então com o aumento do dólar o custo de aquisição aumentou.” comentou o sócio fundador da Hop Bros, Rodrigo Inojosa.

Se adaptar a embalagens diferentes e conviver com prazos mais incertos para o envase do produto acabou se tornando mais comum com os impactos que estão ocorrendo no fornecimento para pequenas cervejarias, o que pode gerar maiores custos para que cheguem até o mercado consumidor,

“Tive que mudar da garrafa inglesa para a garrafa alemã. Faltou papelão para produção de caixas. Faltou material para produção de rótulos e tampinhas personalizadas. Estão ocorrendo demora nos prazos de entrega e produção.” declarou Bruno Faria, sócio fundador da cervejaria rural mineira Três Orelhas.

A negociação com os pontos de venda pode ser um caminho para amenizar as dificuldades impostas pelo momento numa esperança que o cenário se torne mais positivo num médio prazo.

“Iniciamos conversas com eles [supermercados] esta semana e alguns parecem entender a situação, que estamos fazendo o melhor possível nas circunstâncias dadas para fornecer a eles e aos consumidores com as embalagens disponíveis. O fato é que todo o mercado de cervejas artesanais está enfrentando esse problema, e ainda estamos em uma pandemia. Mas espero que os fabricantes brasileiros de garrafas encontrem uma maneira segura de aumentar sua produção no futuro próximo para atender não só as grandes cervejarias, mas também as artesanais” comentou Anna Lewis sobre suas expectativas de como o cenário pode evoluir para a Wonderland.

Já Rodrigo espera que a Hop Bros possa se fortalecer com o aprendizado e novos meios de suprimento possam ser construídos para que a cadeia de produção tenha mais opções num futuro próximo.

“Foram vários desafios e tivemos que ser criativos para continuar operando em meio a essas dificuldades. Buscamos alternativas com alguns materiais assim como novos fornecedores, de forma que considero que saímos mais fortes do que entramos nesse período tão conturbado.” comentou o sócio da Hop Bros.

A situação atual mostra como a luta de pequenas cervejarias, que sempre tiveram de enfrentar grandes desafios para chegar ao mercado, se tornou ainda mais complexa em 2020 com os efeitos da pandemia e a necessidade de aprendizado constante de como se adaptar a um cenário que está passado por mudanças profundas será mais do que necessário nos próximos tempos

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Sobre o autor

Felipe Freitas é engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação Tecnológica pela EQ/UFRJ e analista do mercado de cervejas.