Iniciar uma microcervejaria em um mercado ainda pouco explorado, promovendo engajamento com o público e construindo um crescente volume de vendas não é uma tarefa nada fácil.
Entretanto, esta é a trajetória que tem sido percorrida pela Proa Cervejaria que em cerca de um ano se tornou a principal cervejaria artesanal do estado da Bahia um mercado que nos últimos anos tem ganho seus primeiros players entre os pequenos produtores de cerveja.
Para contar um pouco como tem sido a tarefa de superação desses desafios a fundadora da Proa, Débora Lehnen, compartilhou com a Catalisi suas experiências, visão do mercado e atuação na construção da marca que “rema contra a maré da mesmice”.
“No início buscamos construir a fábrica numa área industrial de Salvador, mas depois percebemos como foi melhor construí-la fora de lá”
A trajetória de Débora até a fundação da Proa foi um misto de seu conhecimento técnico prévio como engenheira química com uma decisão de mudança de rumos na vida profissional, partindo de uma carreira em outro mercado para iniciativa do empreendimento com a cervejaria.
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“Já morava em Salvador há algum tempo e percebia uma escassez de cervejas artesanais, um produto que gostava de consumir, nisso enxerguei uma possibilidade de empreender neste mercado”.
O primeiro passo da engenheira, que é nascida no Rio Grande do Sul, foi a busca de uma formação focada na produção de cerveja e posteriormente a realização de uma série de estágios no interior de São Paulo onde adquiriu bastante experiência não só na fabricação de cervejas como em diversas necessidades da rotina de uma cervejaria.
Após este período de estudo e experiência que levou pouco mais de um ano, foi chegada a etapa de planejamento do negócio onde um sócio-investidor se juntou a Débora para o financiamento da empreitada, para posteriormente realizar a construção e licenciamento que tomaria cerca de mais um ano.
Nos primeiros passos da busca pelo espaço para construção da fábrica um insucesso inicial se demonstrou posteriormente um acerto. A fábrica da Proa era pensada no começo para ser instalada numa área industrial de Salvador, o que acabou não se concretizando.
Ao invés da capital baiana a cervejaria acabou por se instalar em Lauro de Freitas, cidade vizinha a Salvador e cuja a região onde a Proa foi instalada é mais acessível ao público, onde iniciou sua operação no meio de 2018. Esta possibilidade de interação entre público, produção e consumo é fundamental para a cerveja artesanal.
“No início pensamos em construir a Proa numa área industrial de Salvador cujo o zoneamento permitia uma cervejaria. Isso acabou não acontecendo e fomos para Lauro de Freitas onde nos instalamos. Ficamos numa região mais atraente para o público, o que está sendo ótimo para nosso bar da fábrica” analisa Débora.
“A importância de se investir em criar um conceito forte para a marca da Proa foi algo que aprendi ao conhecer as cervejarias da Califórnia ”
Um dos pontos chaves para promover engajamento com o público e ter um produto com reconhecimento no mercado é o cuidado com a construção da marca. Com a cerveja isso não é diferente, e a bebida como um produto vai muito além apenas do líquido.
A decisão da fundadora da Proa foi por escolher um conceito que explorasse uma temática abordando o mar, algo recorrente ao se pensar na Bahia, buscando não deixa-lá cair necessariamente em um conteúdo estritamente regional.
Junta-se a isso a comunicação de um convite ao público em explorar o que a Proa – que é parte da frente de uma embarcação e aponta o seu rumo – produz através das suas criações, numa atitude de desafio traduzido no slogan “Contra maré da mesmice”.
A fundadora da Proa revela que a importância do investimento na construção da marca foi algo que guardou de experiências que obteve ao ter contato com cervejarias norte-americanas do estado da Califórnia.
“A importância de se investir em criar um conceito forte para a marca da Proa foi algo que aprendi ao conhecer as cervejarias da Califórnia. Trabalhei com uma empresa onde fizemos este desenho sobre o conceito da Proa”, revela Débora.
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Uma das tarefas mais complexas de uma cervejaria entrante no mercado é o de construir o seu volume comercial inicial. Um giro de volume adequado para a geração de receita visando a manutenção da operação da cervejaria é crucial para o negócio e deve ser algo muito refletido no planejamento.
Uma das escolhas da Proa foi por investir em chopeiras visando promover a entrada de barris da cervejaria principalmente em pontos de venda não especializados em cerveja artesanal, onde Débora revelou encontrar alguns obstáculos relacionados a realidade do mercado.
“Sabíamos que em lojas especializadas seria mais fácil de encontrarmos a estrutura para plugarmos barris. Já pensando em outros pontos de venda fizemos um investimento em chopeiras para conseguirmos a entrada de nosso chope, porém em boa parte deles não conseguimos entrar devido a exclusividade dada ao portfólio de grandes cervejarias“.
Mesmo com esse obstáculo a Proa conseguiu dentro de seu um ano de vida saltar de 2 mil litros de produção mensal para 12 mil litros, contando com o portfólio de 15 diferentes cervejas produzidas em 10 estilos, das tradicionais IPA, Weiss e Hop Lager às mais diferenciadas, como a Saison, Russian Imperial Stout, e as Fruit Beers de jaca, seriguela e melancia com gengibre, além também de produzir para cervejarias ciganas.
Boa parte desse crescimento é creditado aos bares próprios da Proa, outra estratégia pensada para permitir o escoamento do produto. A cervejaria conta com um bar anexo a fábrica em Lauro de Freitas e também um outro localizado na capital baiana.
“Os bares da Proa estão cumprido um papel importante tanto da questão do volume comercializado quanto nas margens que alcançamos nas vendas diretas ao público” comenta a fundadora da cervejaria.
Débora avança comentando sobre a importância estratégica dos bares próprios da Proa que tem desempenhado um papel fundamental em transmitir o conceito da cervejaria e educar o público.
“Aqui na região de Salvador as pessoas costumam ter uma comunicação muito formal, através dos nossos bares conseguimos criar um ambiente mais relaxado para nossa relação com o público. Além disso, os nossos bares têm nos dado as condições ideais para educarmos as pessoas sobre nossas cervejas e a nossa marca” comenta Débora.
Entre as novidades que a Proa trará para o mercado em breve estão cervejas maturadas em barris, oriundos da cachaçaria Weber Haus – apenas as cervejaria La Trappe e Bodebrown também possuem semelhantes – que resultarão certamente em produtos bastante exclusivos.
Definitivamente a Proa é uma cervejaria para se manter no radar, pois tem contribuído de forma destacada na formação de mercado para a cerveja artesanal numa região importante do país.
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Sobre o autor
Felipe Freitas é analista do mercado de cerveja, engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ. Fundador e editor do portal Catalisi.