com criação de texto de João Pedro Peçanha
Devido à pandemia do novo coronavírus, empresas, marcas e empreendedores estão sendo obrigados a se reposicionarem e se reinventarem no mercado a fim de manterem seus negócios.
Apesar de estarem começando a surgir financiamentos coletivos no sentido de salvar uma série de empresas, os chamados crowdfundings já estão à nossa volta há algum tempo: Vakinha, Catarse, Apoie-se, Patreon entre outros já são comuns quando o assunto de apoio a projetos e negócios..
No meio cervejeiro, esse modelo já possui um histórico. O pioneiro no cenário brasileiro foi o site Social Beers, que deu vida a muitos projetos de ciganos e até mesmo de cervejeiros caseiros que estavam querendo iniciar uma produção comercial. Em troca pelo apoio os participantes recebem prêmios exclusivos.
A partir desse modelo, outros tipos de arrecadação começaram a surgir, porém com outros objetivos. Um caso famoso e de sucesso foi o da cervejaria escocesa Brewdog. Os punks lançaram diversas rodadas de equity (modelo em que parte societária da cervejaria é aberta para um investimento coletivo), formato que ganhou exemplares também dentro do Brasil.
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Recentemente, no mês de Maio de 2020, a cervejaria cigana paulistana Juan Caloto, afetada pelo cenário de crise econômica e sanitária atual, resolveu lançar sua campanha de “ crowdfunding para Salvar Él Juan Caloto”. A cervejaria já possuía experiência com o modelo de arrecadação coletiva para financiar sua atividade. Em 2015 o nascimento do negócio, ironicamente ou não, começou através do modelo de crowdfunding da Social Beers.
A marca construída pela Juan Caloto desde o início se tornou um de seus principais ativos. A cervejaria dos sócios John (apelido de Felipe) e Calote (apelido de Marcelo) se baseou fortemente em transmitir um enredo formado por uma mistura de faroeste macarrônico e história em quadrinhos que passou a angariar fãs entre entusiastas da cerveja artesanal.
Os rótulos da cervejaria se comunicam com o público de maneira simples, trazendo conteúdo artístico e narrativo, visto que todos eles contam uma história e até mesmo seguem um roteiro. Isso se deve ao processo criativo da arte e estética da cervejaria que é executado diretamente por Calote, sendo ele o desenhista responsável pela identidade visual da marca.
Esse investimento na comunicação visual, que é acompanhado por um portunhol recheado de sarcasmo e ironia, desperta a curiosidade de quem vê e lê os rótulos e histórias da marca. A Juan Caloto em maior parte posiciona seu portfólio no segmento de cervejas mais caras, povoado de New Englad IPAs.
“A gente começou a ter a idéia deste processo de crowdfunding quando percebemos que iria ocorrer uma queda significativa no nosso faturamento por conta do isolamento social e começamos a pensar numa forma alternativa em que pudéssemos ter uma receita e que a Juan Caloto não ficasse tão prejudicada nesse período. Também não queríamos criar uma loja própria que pudesse atrapalhar outros canais, que são os PDVs que já trabalham com deliveries e lojas virtuais. Nisso lembramos do nosso projeto de crowdfunding lá do início e comecei a ver projetos semelhantes que empresas estavam utilizando para superar esse momento da pandemia” comentou John sobre a iniciativa da arrecadação coletiva.
Tal qual o projeto que deu início a cervejaria o crowdfunding deste ano obteve grande sucesso. Em 24 horas foi batida a meta inicial de R$ 55 mil e a arrecadação foi extendida chegando ao valor de R$ 165 mil, 300% acima de seu objetivo financeiro.
Importante destacar neste processo o papel decisivo da marca Juan Caloto e sua capacidade de extensão para outros elementos que formaram os prêmios do crowdfunding. Entre as recompensas estavam incluídas futuras dedicatórias num livro (caso Juan y Calote o escrevam), cerveja ( El Retumbante Retuerno de Karina Cristina, uma NEIPA), um jogo de baralho da Juan Caloto e até mesmo uma estatueta del Xerife e placas feitas à mão.
“No processo criativo para este crowfunding o desafio era passar para o consumidor final qual era o objetivo desse projeto, o que tentamos fazer sempre de maneira bem humorada. Eu o Calote nos juntamos para fazer o briefing criarmos o roteiro, depois fizemos a gravação eu editei o áudio e o Calote editou o vídeo. Na estratégia de publicação começamos por uma rede mais próxima de pessoas e depois lançamos nas redes sociais (Instagram e Facebook), no final fizemos uma campanha para nosso público alvo de forma impulsionada nesas redes” comenta John sobre o processo desenvolvido para o crowdfunding.
A resposta do público da cervejaria em relação ao projeto superou as expectativas de John e Calote e serviu para se ter uma maior dimensão do engajamento dos consumidores da Juan Caloto. Os avanços do crescimento de participantes foram constantemente comunicados nas mídias sociais, utilizando a mesma linguagem desenvolvida pela marca, ampliando a percepção da participação coletiva.
“Já temos um contato legal com o público porque nos festivais sempre fizemos questão de estar ali no balcão trocando ideias com as pessoas, mas a experiência deste o crowdfunding superou nossas expectativas. Imaginávamos que chegaríamos a meta em uma semana e a batemos em 24 horas. Ficamos muito felizes e motivados porque fazemos tudo isso com muita paixão e é emocionante enxergar que as pessoas apostam em você para continuar dando vida ao projeto” analisa John sobre o resultado.
No cenário atual, a Juan Caloto tomou a frente para conseguir se manter viva, continuando a desenhar as narrativas tão queridas por seu público – que agora mais do que nunca, se mostrou fiel e apoiador da marca.
“A gente gosta muito de trabalhar de forma colaborativa com o público. Quando começamos compartilhamos o risco do início e tivemos mais pessoas para fazerem parte do começo da Juan Caloto. Sempre estivemos bem alinhados com o que o público da cervejaria esperava das nossas cervejas través de um diálogo aberto durante eventos. Estávamos receosos e com o ‘pé no chão’ porque sabemos que todos estão passado por um momento difícil, por isso ficamos muito empolgados com o engamento das pessoas neste projeto” finaliza Marcelo “Calote” sobre a experiência.
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Sobre o autor
João Pedro Peçanha é psicólogo e mestrando em psicologia pela UFRJ
Sommelier de cervejas e mestre em estilos
Sobre o autor
Felipe Freitas é analista do mercado de cerveja, engenheiro químico, mestre em Gestão da Inovação pela UFRJ. Fundador e editor do portal Catalisi.